Última alteração: 2017-09-15
Resumo
No estudo da atuação parlamentar, identificam-se duas principais arenas: a eleitoral e a legislativa. A primeira refere-se aos trabalhos desenvolvidos pelo parlamentar junto a sua base eleitoral. Nesse cenário, o deputado preocupa-se, primeiramente, em atender as demandas daqueles que o elegeram. Já na arena parlamentar, o deputado busca notoriedade via produção legislativa e pela forma que atua no Parlamento, seja na apresentação de projetos, emendas, em discursos proferidos no Plenário ou nas comissões.
Segundo Bezerra (1999, p.37), essas duas atribuições não possuem o mesmo valor político. Segundo a teoria dos ciclos eleitorais, dos resultados da atuação parlamentar nessas duas arenas, os eleitores tendem a valorizar mais e recompensar os incumbentes quando o produto da representação parlamentar gera benefícios individuais. Aprovação de leis nacionais, por exemplo, que teria efeitos para toda a nação, tende a ser considerada menos relevante.
Nesse contexto, esta pesquisa busca entender como o deputado federal lida com o fato, à primeira vista paradoxal, de deter mandato nacional, mas necessitar sinalizar à base que se preocupa com questões locais. Para tanto, dialoga-se com duas correntes do Novo Institucionalismo: o modelo distributivista e o partidário. Se por um lado, a teoria partidária prediz que o Legislativo funciona em torno do partido e que o parlamentar sozinho não tem atuação na arena legislativa, por outro, a teoria distributivista afirma que os deputados, preocupados com a reeleição, voltam a atenção para a arena eleitoral e para o atendimento dos interesses da base eleitoral, agindo de forma individual e personalíssima. No caso brasileiro, percebe-se que na arena eleitoral a bandeira partidária torna-se algo secundário. Em contrapartida, na atuação no Parlamento, regras regimentais tornam central a figura do líder partidário, elevando a relevância do partido no processo político decisório e diminuindo a força individual do parlamentar e sua capacidade de alocar recursos em questões localistas.
Estudos, como o de Marcos Bezerra (Em nome das Bases: política, favor e dependência social), ressaltam, contudo, que a estrutura e o funcionamento dos gabinetes, constituídos como verdadeiros escritórios de atendimento às bases políticas dos estados de origem do deputado federal, podem ser a válvula de escape que permita ao parlamentar contornar a concentração de recursos legislativos do processo político decisório nas mãos dos líderes partidários. Portanto, o objetivo central da pesquisa é revelar relações entre o comportamento dos parlamentares nas duas arenas e os mecanismos utilizados por eles como instrumentos voltados para a mantença ou aumento do capital político que lhe possibilitem uma eventual reeleição.
Para analisar e compreender o comportamento de seus membros, a pesquisa concentrou-se em, primeiramente, um dos partidos da Câmara dos Deputados, com vistas a subsidiar possíveis pesquisas posteriores para as demais bancadas. O estudo tem, ainda, caráter transversal, uma vez que serão analisados os dados para a 55ª Legislatura. A metodologia adotada, de cunho qualitativo, consiste, portanto, em estudo de caso dos 20 deputados do Partido da República (PR) reeleitos para a 55ª Legislatura. A razão dessa escolha está baseada em dois critérios: primeiro, tem-se que o PR, que constitui a quinta maior bancada da Câmara dos Deputados, é um dos partidos médios da Casa, o que exclui os partidos denominados nanicos e os partidos maior capilaridade municipal, como o PMDB. Busca-se, com isso, evitar possível viés na amostra devido ao tamanho do partido. Segundo, com a escolha do PR, uma bancada que não apresenta defesas claras de nenhuma política pública, excluem-se partidos em que a ideologia ou a bandeira partidária igualmente pudesse influenciar os resultados das eleições. Toma-se por premissa que o PR, por não se apresentar como ator principal nas decisões políticas, teria dificuldade, na arena eleitoral, de obter votos por meio da bandeira partidária. Ou seja, neste caso, os parlamentares reeleitos pelo PR para a 55ª Legislatura, possivelmente, conservaram os seus votos sem interferência das lideranças partidárias.
Como ferramentas metodológicas foram adotadas entrevistas em profundidade com assessores parlamentares dos gabinetes dos deputados para compreensão da atuação parlamentar em prol da base. Também foram realizadas entrevistas com os parlamentares, para as quais adotou-se os pressupostos da elite interviewing como forma de abordagem.
Durante a pesquisa, constatou-se que não há uma teoria específica que se aplique ao comportamento do parlamentar brasileiro. Se por um lado é possível afirmar que os deputados têm como principal objetivo a reeleição e, desta forma, direcionam seus esforços ao atendimento das bases eleitorais, por outro, no Parlamento, os eleitos reconhecem a força das instituições partidárias e atuam para atender às necessidades da legenda. Ora atendendo aos eleitores, ora atendendo ao partido, os parlamentares podem ser vistos como verdadeiros conciliadores desta relação antagônica. Com esse comportamento os deputados têm obtido êxito e estão sendo reeleitos. No entanto, vale destacar, o sucesso da reeleição só tem acontecido porque os eleitores ainda não focam seus olhares para a atuação do parlamentar no Congresso Nacional, mas, sim, unicamente, para o atendimento dos interesses municipais.